Contemplação da Lua 2022 (Grêmios Águas de Março e Sabiá)

(Colaboração de Benedita Azevedo)
Atualizado em 27/04/2022

Meu primeiro tsukimi foi em em 12 de abril de 2006. Começara a participar do Grêmio Haicai Ipê em agosto de 2005. Viajei 70 km de Magé até a cidade do Rio de Janeiro e de lá embarquei no ônibus da Rodoviária Novo Rio até o Terminal Tietê em São Paulo, numa viagem de seis horas, completando o percurso de metrô até o bairro da Liberdade. Jantei no Café Sol e fui ao encontro dos haijins no Espaço Cultural Soto-Zenshu – Templo Busshiji, onde aconteceu o evento. Fascinada pela nova experiência, tatuada para sempre na memória, ao final do tsukimi, embarquei de volta na estação de metrô São Joaquim e logo peguei o ônibus para o Rio de Janeiro. Feliz da vida!

Em 2009, já coordenando os dois grêmios, numa visão mais voltada para o coletivo, em noite poética, haicaístas do Rio de Janeiro, Niterói e Magé reuniram-se na Confeitaria Colombo, nas dependências do Forte de Copacabana para o tsukimi (contemplação da primeira lua cheia de outono, com comida, bebida e composição de haicais, uma tradição dos japoneses). Desde então, nosso tsukimi, seja presencial ou virtual é sempre em função dos grêmios.

Neste ano de 2022, embora tentássemos reunir alguns haijins presencialmente, não conseguimos. Mais pelo medo da violência urbana que da pandemia. Entretanto, a participação virtual foi muito animada. De 16 a 18 de abril, os haijins observaram a lua cheia, escreveram seus haicais e postaram nas páginas de seus grêmios. Deixo aqui uma seleção dos poemetos.

Alan Resende

De costas para a sala
a mãe fita a lua cheia —
Insetos na lâmpada

Na poça da rua
25 centavos —
Lua-desta-noite

Sono na floresta —
Pelo nylon da barraca
o clarão da lua

Uns bebem e dançam,
outros apenas conversam —
É festa da lua

Lua de outono —
Vejo no rosto da amada
sua cicatriz


Álvaro Posselt

Subindo o morro
com meu radinho de pilha —
A lua cheia


Benedita Azevedo

Do alto do prédio
a cidade iluminada—
Lua desta noite.

O brilho da nuvem
sob a luz da Lua fria—
sombras pelo chão.

Visão da lua cheia—
No décimo primeiro andar
A sala vazia.

Marina da Glória—
Nas embarcações do mar
o clarão da lua.

Sobe a lua cheia—
O monumento aos pracinhas
na sombra da nuvem.


Bruno Ítalo

a janela aberta
apesar das muriçocas —
lua-desta-noite

pequena janela —
na imensidão da noite
a imensidão da lua

à janela do filho
a conversa sussurrada—
brilha a lua cheia

depois da passagem
de nuvenzinhas velozes —
a Lua polida

noite de maré
no vai e vem dos olhares —
tsukimi virtual


Carlos Bueno

Nuvens brancas
passam rapidamente —
Noitinha de outono.

Um mártir sem cruz
parece com mestre Jesus —
Dia vinte um de abril.

Domingo de ramos —
Inicia a semana santa
dos peregrinos.


Carlos Martins

Lua-desta-noite
Simplesmente solitária
no céu sem nuvens

Solidão sem fim
A Lua cheia brilhante
cercada de nada

Um “voyeur” no escuro
a lhe admirar as formas
Lua de outono

Neste meu pedaço
de céu coberto de nuvens
A Lua se esconde

“Tsukimi” virtual
A alegria dos haijins
na tela brilhante


Carlos Viegas

profundo silêncio
a luz pálida da lua
invade o cerrado

sigo pela trilha
solidão iluminada
pela lua cheia

olho em minha volta
o clarão da lua cheia
toma a retina


Cyro Mascarenhas

Noite iluminada.
Pensar que a lua, lá no alto,
é a mesma na Ucrânia…

Mudança no céu:
agora brilha uma estrela.
Lua não está só.

Ao cair da tarde
surge a lua-desta-noite.
Um cachorro late.

Contemplando a lua:
longe do olhar curioso
um casal se beija.

Infância distante:
“a benção dindinha lua!”
Noite de luar.


Daniel Morine

Lua desta noite —
dirijo alguns quilômetros
para vê-la nascer

contemplação da Lua
ao surgir entre as nuvens —
um brinde de vinho

passeio noturno —
toda a família
brincando com a lua

a caminho do porto
o navio iluminado —
reflexo da lua

Lua desta noite —
nem se parece
com essa da foto


Elisa Campos

Lua desta noite
pincela em tom “noir”
o morro distante

casal na praça
não tem pressa de voltar
Lua outonal

sob o luar
pontinhos negros voejam
pássaros outonais

fico zazen
vendo a quietude do campo
Lua outonal

reflete sem brilho
um círculo vago no lago
Lua outonal


Elizabeth Cury Bechir Watanabe

Orla cheia de luz
Um passeio romântico
com o clarão da lua

Noite iluminada
abraçados contemplamos —
A lua dos haijins


Franklin Magalhaes

No céu, só a Lua —
aonde foi a Via Láctea
da minha infância?

Passeio de mãos dadas —
namorados de hoje em dia
nem sabem da lua


Fernando Manuel Bunga

Janela aberta —
Na cama do homem só
o clarão da lua

Festa da lua —
O haijin com sono
vai lavar a cara

Lua desta noite —
Mosquito que ronda o corpo
não tira a minha paz

Mosquito na mão,
leva quantos litros quiser –
Tsukimi


Marco Aurélio Goulart

Conversa entre amigos —
O clarão da lua chega
paulatinamente

Com música e vinho
olhares se voltam a ela —
Lua-desta-noite

Ah! lua de outono!
Sem nuvens ao redor
sobe majestosa


Matusalém Dias de Moura

Já alta no céu
entre uma nuvem e outra
A lua de outono.

Por toda a planície
após a nuvem passar
O clarão da lua.

Entre um poste e outro
A lua detrás do prédio
faz sombra na rua.

Um fio de luz
bem no canto da janela
A lua de outono.

De volta da rua —
Sobre o edifício mais alto
a lua de outono.


Moduan Matus

Algumas nuvens
E a noite de lua cheia.
Quanto encanto!

A lua clara
Num céu harmônico
Magia da noite.

Entre árvores
A lua quase escondida
E o vasto clarão.


Mônica Monnerat

Lua tão distante —
Paira por um só momento
sobre a rua torta

Dorme, ruazinha —
Lua de outono cansada
não vem hoje, não…

Noite sem luar
Ainda assim, aos pouquinhos,
vida quase normal…

Cidade pequena
Na pracinha mal cuidada,
o imenso luar…

Lua-desta-noite
Cadeiras simples na frente
das casas do morro


Natalia Yamane

A espera da lua
De celular em punho-
Noite de ausência

Lua de outono-
Nos perfis do colegas
Clara e bela


Raymundo Luiz Lopes

As nuvens cinzentas
escondem a lua outonal —
sonho com o luar

Expectativa!
Pela estrada escura aguardo
chegar a lua cheia

A lua não aparece
nesta noite nublada —
a verei amanhã

Tsukimi on line
os haijins ficaram tristes
na noite chuvosa

Os mochis molhados
na hora do tsukimi —
deuses sem oferendas


Regina Coeli Nunes

A lua cheia
desenlaça-se do céu
e dança no mar.

Eis a lua cheia.
Iluminação total
atrai as pessoas.


Regina Alonso

A lua encoberta
O clarão por trás das nuvens
encanta os haijins…

Estrela solitária
Tsukumi desta noite
é um show de luz…

Um fio de prata
parece bordar as nuvens –
Lua de Bashô…

O céu virou mar?
Navega a lua no azul
entre brancas nuvens…

Deitado na areia
adormece o andarilho —
A lua em vigília


Rosane Silva

Assim como chegou
parte no mesmo passo
Lua na janela

Nos ares do sul
Contemplação da Lua
sob o cobertor


Rose Mendes

tantos olhares
para a lua-desta-noite —
leve instante

céu nublado
a contemplação da lua
ao lado da filha

janela aberta —
até o meio do quarto
o brilho da lua

passagem da lua
a janela desbotada
rebrilha de novo

na rua de casa
passos mais vagarosos —
noite de lua cheia


Sandra Hiraga Yoshimura

Mágico outono —
Apenas a meia lua
se mostra no céu.

Tímido luar –
Contempla sua chegada
apenas estrelas.

Sem cliques nem poses
chá quente pra inspirar —
Lua solitária.

Na rua deserta
um mendigo acompanha
a lua no céu.

A passos largos
apenas a cama quentinha —
Lua solidária.


Severino José

nessa idade
com meus quês de saudade
ah!, lua outonal

estando contigo
nem sei o que lhe digo
lua desta noite

neste momento
sobre o estacionamento
luar de outono

luz
da lua cheia
na veia


Sil Lis

Cricrilam grilos.
No silêncio da noite
Clarão de Luar.

Hora de dormir
Resplandecente no céu
Alta vai a Lua.

Fechado o livro.
No apagar do abajur
Lua a iluminar.

Frescor da noite.
Alguns latidos de cães
Na noite enluarada.

Belo motivo.
Sem sono observar a lua
E fazer haicais.


Taís Curi

Lua-desta-noite
brinca de se esconder —
Haijins ansiosos

Noite sem luar —
O passeio à beira-mar
agora às escuras

Procurando a lua
de janela em janela —
Será que ela vem?

Haijins sorridentes
escrevem em seus bloquinhos —
Finalmente a lua